Método de Leitura e Escrita de João de Deus
Sendo que o homem não chega espontaneamente a descobrir a estrutura fonética da língua, alguns autores defendem actualmente que o sucesso do ensino da leitura no ensino alfabético reside, exactamente em ajudar criança a captar a existência dos fonemas, que são as unidades mínimas e abstraías da língua (Clement 1987).
João de Deus já tinha interiorizado no seu método estas noções agora preconizadas. Vejamos o que ele diz na 3a lição da Cartilha Maternal, e no seu guia prático: "temos achado útil cobrir e descobrir alternativamente o v, nas palavras vai, via, etc, fazendo ler ora ai, ora vai, ... a fim de certificar o principiante do papel que o v representa na escrita..."
Outro aspecto que marca a actualidade do método são as recomendações que faz aos professores, para que ajudem as crianças a sentir o funcionamento dos seus órgãos fonadores para melhor entenderem a imagem sonora e para uma melhor consciencialização da noção de fonema e da sequência de sons nas palavras. A respeito do 1, por exemplo, João de Deus diz que "uma indicação podeis fazer muito clara e profícua, ao vosso aluno, e é que deixe a língua pegada ao céu da boca. Por um dos muitos mistérios da palavra, assim se profere elegantemente o l final, ou posterior à voz".
O Método João de Deus segue uma via completamente original, quando apresenta as dificuldades da língua de uma forma gradual, numa progressão pedagógica que constitui um verdadeiro estudo da língua portuguesa. Assim verificamos que desde a primeira lição a criança é convidada e estimulada a ser "analista da linguagem", isto porque desde a primeira lição a criança tem um papel activo na descoberta de que a posição da letra na palavra determina o seu valor sonoro.
A criança é levada a entrar num jogo, do qual vai aprendendo regras e vai evoluindo de uma forma construtiva. O processo inicia-se com a visão das letras, seguindo-se os sons correspondentes, a leitura de palavras e a pronunciação destas como entidades globais com significado próprio.
Cada letra consoante é incluída numa lição em que estão reunidos os seus diferentes valores, as letras consoantes são ordenadas em função do seu número de valores, sendo ensinadas primeiro as que correspondem foneticamente a fricativas "certas", ou seja aquelas que só tem uma leitura, um valor, um som. Assim, e depois de apresentar as vogais, sem as quais não há palavras, as primeiras letras consoantes " certas" que se ensinam são v, f, j, (constritivas - fricativas) cujo valor se pode proferir e prolongar. Depois o t, d, b, p, (oclusivas), que resultam de uma obstrução total da saída do ar, não tendo por isso, valor proferível. Depois aparecem a constritiva lateral 1 e a oclusiva q. Só depois aparecem as consoantes "incertas", aquelas que têm mais do que um valor, mais do que um som, conforme a sua posição na palavra, são elas: c , g, r, z, s, x, m, n. Nesta metodologia são respeitados os postulados da psicologia, partindo-se sempre do mais simples para o mais complexo.
Em resumo, este método acentua o aspecto da compreensão, salienta as funções da memória, da atenção e do processamento mental da informação durante a leitura. As palavras que a criança lê , activam esquemas da sua memória que a auxiliam na compreensão do seu significado. Desta forma a criança consegue fazer a integração das palavras lidas em contextos do mundo real.